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Bordando o feminino, na coluna de Bruna Valença

7 minutos de leitura

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Conheço e admiro o trabalho de Laís Domingues, artista visual super talentosa de Recife cuja arte é fora da curva. Tudo que Laís cria vem de uma bagagem criativa genuína e carrega uma originalidade especial. Ela brinca com os formatos. Passeia entre o bordado, a fotografia, métodos e técnicas de revelação analógica antigos como a Cianotipia, e o Van Dyke, processos extremamente alternativos que invocam estéticas mágicas em tons azulados. Imagens que parecem mesmo sair de um sonho, sabe? <3

Estou no momento fazendo oficinas de Bordado com ela e a ajudando no seu laboratório e numa das nossas tardes regadas a muito café resolvi ter essa conversa com ela pra compartilhar com vocês!

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BV: Me conta um pouquinho de como surgiu a sua trajetória com o bordado?

LD: Começou no final de 2015. Eu sempre tive essa coisa de tentar experimentar. Primeiro com a fotografia analógica que se desenvolveu bastante quando vivi em Buenos Aires, lá também já comecei com uns processos de intervenção com aquarela nas fotos. Sempre tentando experimentar com a foto impressa. Em um dia osioso, sem computador e sem internet, peguei umas fotos minhas, linha e agulha e comecei a costurar pra ver qual é… Uma amiga que morava comigo tinha um kit de bordado e me deu! Já comecei a olhar pra algumas fotos de maneira diferente. Imprimi uma série e comecei a bordar bem intuitivamente. Nunca tinha feito uma aula, só sabia o ponto básico, e comecei a experimentar. Bordar no papel é totalmente diferente de bordar no tecido, por exemplo. Aprendi muita coisa no Youtube por um tempo, participei de algumas oficinas onde pude aprender um pouco mais, mas a maioria foi vendo coisa na internet mesmo. No início começou como uma terapia. Eu sou uma pessoa acelerada e percebi que com o bordado eu despertei um lugar de parar. Me concentrar, ter paciência, sabe? Se você for querer ver imediatamente como vai ficar o seu bordado, você não termina nunca. Então o processo me ensinou muito sobre desacelerar.

BV: Quero muito saber sobre o teu projeto com as Bordadeiras de Passira no interior do Agreste de PE. Como surgiu a ideia?

LD: Em 2016 abriu o edital no Funcultura, e eu tive essa ideia de fazer um intercâmbio cultural com as bordadeiras de Passira no intuito de aprender mais sobre o bordado. Não foi aprovado por falta de documento. Em 2017 tentei novamente a inscrição, mudando a linha de ação/categoria para “Artista Iniciante” e foi aprovado. E aí comecei a pensar em qual a contra partida que esse projeto vai ter efetivamente para as bordadeiras? No inicio seria um intercambio onde eu ia passar 4 meses em Passira, ia aprender bordado com elas, elas receberiam por isso, e eu também registraria tudo com fotografias e vídeos para nós todas. Depois eu selecionaria algumas fotos e faria uma exposição falando sobre a história delas, mas no final das contas acabou se tornando um retorno muito maior pra mim do que pra elas, sabe? Em uma das idas a Passira, conversando com Dona Lúcia, uma das líderes da associação das bordadeiras de Passira as questionei do que seria interessante para a Associação como contrapartida. As bordadeiras vinham desenvolvendo blusas, mas não conseguiam desenvolver uma coleção com tema, modelagens diferentes, etc. Dona Lúcia comentou que seria massa as meninas mais jovens de Passira terem aulas variadas de bordado, modelagem e tingimento para estimular a produção local e lançar uma coleção completa. Chamei Tanina Godinho, amiga e estilista que já tinha um trabalho de intercâmbio com as tingideiras tradicionais da Bolívia, com uma experiência com comunidades e que tem uma pegada mais slow fashion. Ela também topou participar do projeto, a gente inscreveu o projeto voltado para a comunidade com esse retorno para elas, e foi aprovado. Ela deu aulas de modelagem e tingimento natural. A coleção “Filhas do Sol” toda foi tingida naturalmente com coisas que pegávamos na feira de Passira.

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GE: Você morou uns meses em Passira para realizar o projeto. Em que te agregou?

Foi essencial estar ali. Sai da capital e morar numa cidade do interior pela primeira vez, onde todo mundo se conhece, onde o contato é de uma proximidade e intimidade incrível, morávamos na frente da Associação das Bordadeiras, e a nossa casa se tornou uma extensão de lá, e era onde a as aulas eram realizadas, com muitas mulheres talentosas passando por lá! Foi importante para eu entender o bordado como profissão, como uma fonte de renda, e não como um hobby. Estar numa cidade onde todas as mulheres vivem daquilo e fazem como profissão foi algo inspirador. De ver o bordado como uma resistência feminina mesmo, sabe? As mulheres sustentam as suas casas com o bordado.

GE: Que artistas atualmente te inspiram?

Rosana Parlino, pesquisadora e artista visual têxtil, trabalha com bordado, aborda muito o tema racial e de resistência. Aline Brant, do RJ, arrasa muito, tem uma linha parecida com fotografia e bordado e eu curto muito, Juana Gomez, chilena, Karen Dolorez com a técnica do crochê. Violeta Parra, deusa, conhecida como cantora mas tinha um trabalho com tapeçaria que era incrível!

GE: O que a gente pode esperar da tua exposição atual? 

Fala muito sobre território, sobre uma ânsia por liberdade e um resgate das raízes e da ancestralidade. Sobre um processo de auto descoberta, de me descobrir em quanto artista visual, coisa que eu não me aceitava demais até então, e do reconhecimento do trabalho dessas mulheres também. São fotografias minhas delas com bordados que foram muito inspirados em pesquisas dos pássaros locais de Passira e inspirações diárias que trocamos juntas. Fala desse território do processo de criação do eu com o outro, sabe? A coleção que foi fruto do projeto e da troca, intitulada “Filhas do Sol” vai estar exposta também! 

A exposição fica no SESC Casa Amarela, em Recife, até 30 de agosto!

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